Meu Caro Antonio,
Acabei de ler um artigo no jornal em que o autor dizia :
"O futuro é um porto distante para quem navega um dia de cada vez"
Foi inevitável lembrar de nossas conversas sobre o tempo, a vida, o amor, o que passa e o que fica, a necessidade de uma certa previsibilidade, a incapacidade de lidar com o inesperado - esse vilão à espreita a cada segundo de nossas vidas - mudando, desfazendo, criando, desorganizando, trazendo significados, revolucionando.
Lembrei do seu ar filosófico-professoral ao dizer que eu pensava demais, esperava demais, me preocupava demais e sofria demais; que era preciso viver um dia de cada vez.
Eu sou demasiada mesmo : tão demasiada que às vezes tenho a sensação que passei do ponto e do porto.
Tenho lido cada vez mais. Descubro nos livros um mundo onde as surpresas causam danos controlados ou pequenas alegrias passageiras que tem um efeito anestésico.
Alguns livros provocam um emaranhado de emoções, consciências em fuga e momentos onde em alguns flashes me encontro nos personagens: ora por identificação,ora por crítica, ora por pura inveja.
Os livros são um meio de escapar das necessidades imediatas que os anseios produzem, do contínuo desejo de construir um futuro.
Lembro da minha idéia de futuro na infância:
"Casinha com chaminé, jardim com cerca branca, um trabalho que gostasse, um amor que bastasse."
Tenho a cerca! Não é branca...mas nela existe um portão, que se abre todo dia para que eu saia e construa o resto que precisa ser construído. Confesso que às vezes acredito que há pouco a ser construído, mas saio assim mesmo, senão viro um caracol.
A chaminé dispensei, há cinzas suficientes pelo caminho.
Quanto ao amor que bastasse, continuo brigando com a esperança de encontrá-lo mas a possibilidade continua trazendo algum alento.
Um beijo com carinho,
Roberta