Tão longo amor
Os dois amigos se encontraram no cemitério mais uma vez.
- Sabia que você estaria aqui.
- E eu que você viria.
- E lá se vão cinco anos.
- Parece vinte.
- A dor faz o tempo ter preguiça.
- Tempo, tempo,tempo.
- O velho inimigo ou o remédio?
- Já não sei mais.
- Ainda sente muito a falta dela?
- Muito!
- Achei que o tempo ajudaria.
- De certa forma a gente aprende a viver com a ausência.
- Eu nunca aprendi.
- Por isso você ainda sofre tanto.
- Dia desses entrei no cinema pra me distrair e...
- E o que aconteceu?
- Desmontei.
- Por quê?
- Em determinado momento o personagem diz: "Então você busca o esquecimento na solidão. Mas a solidão apenas faz você murchar".
- E é assim que você se sente?
- Exatamente. Murcho,oco.
- Mas a vida continua.
- Odeio esse cliché.
- A vida é uma coleção de clichés, não é?
- Irônicamente, é.
- É preciso aceitar a dor.
- Eu não aceito porque acho injusto como perder um jogo de futebol nos pênaltis.
- Vocês tiveram pouco tempo, não é mesmo?
- A gente sempre se amou mas até descobrir que era amor, demorou.
- É verdade. Como desperdiçamos o tempo que não temos.
- Sabe de uma coisa?
- O quê?
- Apesar do pouco tempo, valeu cada segundo ao lado da sua irmã. Ela me fez ver a vida de um jeito diferente, fez a vida ter significado.
- E se tivesse oportunidade de viver tudo novamente?
- Faria tudo igual.
- Mesmo sabendo que no final sofreria como tem sofrido?
- Mesmo assim, faria tudo de novo como naquele soneto do Camões.
Sete anos de pastor Jacó servia
Mas não servia ao pai, servia a ela,
Em lugar de Raquel lhe deu a Lia.
Como se a não tivera merecida;
Para tão longo amor tão curta a vida.<br "="">
Antonio Augusto