Sobre amores modernos

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Trincheiras

Postado por Antonio Augusto em 26 Março

Trincheiras

 

Sentado na varanda, devorando um romance histórico ambientado na Primeira Guerra Mundial, Jomar se inquietou ao lembrar que há longos sete dias, oito horas e vinte minutos não falava com Silvia.

Tudo aconteceu muito rápido : uma reclamação sobre algo pequeno (são sempe coisas pequenas) virou um discussão, troca de palavras duras, vozes alteradas, porta batida e o silêncio desde então.

Tentando se concentrar no livro, mergulhou nos detalhes da vida dura nas trincheiras, bases improvisadas em buracos buracos cavados pelos dois exércitos adversários, que marcam posições defensivas e passam longos períodos esperando o próximo ataque. A tensão e o medo consomem e causam mais danos à alma que ao corpo.

A medida que lia, Jomar percebia que ele e Silvia haviam construído suas próprias trincheiras naquela guerra particular. Isso sempre acontece quando partimos das certezas, principalmente quando existe a crença que estamos certos e o outro, bem o outro, está errado.

Cansado de estar certo mas distante, Jomar resolveu ligar.

- Oi, Silvia Cristina.

- Só minha mãe usa o meu nome composto e quando está brava.

- Não estou bravo.

- Eu estou.

- E certa.

- Claro.

- Estou lendo um livro e tive uma ideia.

- Qual?

- Precisamos siar das nossas trincheiras.

- Xiiii….

- Vamos inverter o que estamos acostumados a fazer.

- Como assim?

- Ao invés de gastarmos tempo provando ao outro porque estamos certos, vamos começar admitindo os erros.

- Admite erro quem errou.

- Silvia Cristina, ponha as armas sobre a mesa, por favor.

- Tá bom. Você começa.

- Eu acho que errei ao não ter levado a sério sua reclamação, ao ter sido sarcástico, impaciente e intolerante.

- Tá faltando.

- Faltando o quê?

- Pedir desculpas, ora?

- Tá bom! Desculpe por ter sido insensível, sarcástico, impaciente e intolerante.

- Tá bom.

- E você, onde errou?

- Deixa ver…

- Silvia Cristina!

- Eu acho que tenho um monte de desejos que não expresso claramente, fico esperando que você adivinhe, me surpreenda e aí…

- E aí?

- Eu me frustro e começo a ficar rabugenta.

- Que mais?

- E começo a pegar no teu pé, a achar um jeito de te irritar. É a forma de fazer você pagar por ter me frustrado.

- E não vai pedir desculpas?

- Preciso pedir?

- Eu pedi.

- Desculpe, Jomar.

- Você só me chama pelo meu nome quando está brava.

- Foi só pra te cutucar.

- Agora que saimos da trincheira, quando e onde vamos assinar o armistício?

- Em sua casa ou na minha?

- Território neutro. Aquele hotel boutique que usamos em ocasiões especiais?

- Armistício com fogos de artifício?

 

Antonio Augusto

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Sobre o Autor

Escritor

Antonio Augusto escreve sobre o que vê, sente, entende e aprende.

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