De onde vem a inspiração?
Caio Norton se tornou um escritor de sucesso mundial. Seus cincos livros, uma saga de romance e ação na França ocupada durante a Segunda Guerra Mundial. As histórias de espiões ingleses e americanos, combatentes da Resistência Francesa e oficiais da Gestapo prendiam a atenção dos leitores. No meio da tensão e suspense sempre havia espaço para histórias de amor inusitadas. Chamava a atenção a riqueza de detalhes históricos que transportavam os leitores para cada cenário cuidadosamente construído, transportando-os para algum lugar no interior da França entre 1939 e 1945.
Os livros viraram uma série de TV e as redes sociais se encarregavam de aumentar a fama e especular sobre o futuro dos personagens e as próximas histórias. Mas havia um problema, Caio tentava há 18 meses começar o sexto livro mas não conseguia. Talvez fosse o famoso bloqueio de escritor, ou quem sabe o peso da fama e a responsabilidade de produzir mais um sucesso.
Numa das muitas noites de insônia e angústia, sentado na varanda da casa de campo que havia alugado, percebeu surpreso que havia um estranho sentado na poltrona ao seu lado.
- Quem é você?
- Um espírito!
- Eu não acredito em espíritos.
- Tá na hora de começar a acreditar. Tendo dificuldades em escrever?
- Como sabe ?
- Eu sempre te ajudo a escrever.
- Ajuda como?
- Contando as histórias pra você escrevê-las.
- Ou seja, eu sou apenas um datilógrafo moderno.
- Não é bem assim.
- Só faltava essa.
- Era engraçado ver suas entrevistas falando do processo criativo. Quanta baboseira e que ego inflado, hein?
- Vai tripudiar agora?
- Não, mas um pouco de humildade seria recomendável.Você nunca desconfiou?
- Como assim?
- A riqueza de detalhes nos seus livros…quer dizer, nos nossos livros?
- Achei que fosse resultado da pesquisa, meu caro.
- Você está invertendo a ordem das coisas. Na verdade a pesquisa era feita para confirmar o que você já hava escrito. Lembra do submarino alemão U568?
- Claro que lembro.
- Você achou que havia inventado até o número do submarino e qual não foi a surpresa ao saber que ele realmente existiu?
- Coincidência.
- E aquele tanque Panzer alemão que entrou na Igreja em Oradour-sur-Glane?
- Constava do diário de um Capitão alemão.
- Outra coincidência?
- Quer dizer então que eu não criei nada, que as histórias foram contadas por você e eu apenas as trascrevi.
- Psicografou.
- Isso, psicografei.
- Você acha mesmo que poderia ter escrito aqueles diálogos apaixonados entre Marie-Chrstine, a espião francesa, e o Major Schoebitz, da SS?
- Achei que sim.
- Você é seco e sem sensibilidade.
- É o que sempre ouvi.
- E como acha que escreveu aqueles diálogos apaixonados.
- Achei que era inspiração.
- Transcrição.
- E agora?
- Você vai ter que mudar o estilo. Estou saindo para um período sabático.
- E quem vai te substituir?
- Pedi ao Vitor Hugo pra te dar uma força.
- Chega de miseráveis! Outra opção?
- A Jane Austen.
- Fazer o quê? Vou ter que aceitar sem orgulho nem preconceito.
Antonio Augusto