Sobre amores modernos

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Pires, pratos e poços

Postado por Antonio Augusto em 17 Março

 

Juvêncio se considerava um autodidata. Havia aprendido muito com os livros de psicologia, conversando com padres, pastores ,psicólogos, psiquiatras e visitado manicômios. Tinha grande conhecimento da alma humana, seus vícios, desejos e contradições. Os sessenta anos de vida e tudo que havia presenciado e ouvido falar, eram suficiente para não mais se surpreender com o que os humanos pudessem criar.

Sua capacidade de ouvir, observar , ser solidário e acolher, fez dele um terapeuta informal com um belo histórico de intervenções de sucesso. Salvou casamentos, desfez intrigas familiares e reconciliou pessoas cujos rancores recíprocos pareciam descortinar uma história de ódio sem fim.

Ele sempre tinha a observação que oferecia uma perspectiva diferente, apontava um novo caminho e,de alguma forma, desatava nós. Ele ouvia tão bem quanto se fazia ser ouvido e seguido. 

Juvêncio sentia no seu íntimo um certo chamado para ajudar as pessoas. Ele gostava de pessoas e gostava de ser um instrumento do entendimento e da conciliação.

Com o tempo desenvolveu sua própria teoria. Achava que era necessário disseminar o conhecimento por ele adquirido.

Sua teoria era simples. Para ele tudo era questão de profundidade, ou da diferença de profundidade. Acreditava que existem no mundo três tipos de pessoas : os pires, os pratos fundos e os poços.

Os pires são aquelas pessoas rasas, que não se aprofundam em nada, vivem uma vida superficial, não questionam, não se questionam, vivem como se aqui estivessem a passeio. Não ligam os pontos, não se preocupam em aprender com os erros. Na verdade, nem mesmo tem consciência do que é um erro. Os pires vivem e pronto.

Os pratos fundos são pessoas com alguma profundidade pero no mucha. Tem consciência de alguns erros, procuram aprender com eles mas não conseguem penetrar muito,se cansam com as questões existenciais que a vida traz.

Os poços são os filósofos por natureza. São curiosos, irrequietos, questioandores, pensam, refletem e às vezes se perdem nos labirintos onde a mente os leva. Tem dúvidas e estão sempre sedentos por respostas, adoram perguntas,debates e controvérsias.

Segundo a teoria do Juvêncio, os problemas de relacionamento surgem quando existem desencontros entre os tipos que se relacionam mas tem profundidades diferentes. Perceber as diferenças e seus impactos é uma maneira de entender e resolver os conflitos.

Alguns exemplos :

Um pires e um poço

Para o pires a relação é cansativa, o poço questiona o tempo todo e,na visão do pires, pensa demais e vive de menos. O relacionamento é cansativo para o pires que vive em estado de tensão, esperando sempre a próxima pergunta. O poço, por sua vez, vai à loucura com a falta de profundidade do pires e com a falta de um diálogo que leve mais de três minutos. O poço quer saber pra onde vai e o pires nem mesmo sabe aonde está.

Um prato fundo e um pires

Como o prato fundo não se aprofunda muito, para ele é menos complicado conviver com um pires. O prato fundo questiona pouco e o pires nada questiona. A relação tende a um equilíbrio de forma tranquila. Quando o prato fundo insiste em se aprofundar o pires normalmente reage com humor e fica tudo bem.

Dois poços

A relação é densa e complexa, repleta de papos-cabeça. No início é como se os dois tivessem encontrado a alma gêmea mas, depois de um tempo a intensidade leva ao cansaço pois todo movimento tem que ser analisado, explicado, entendido e a chatice toma conta da relação.

 

Existem outras combinações mas Juvêncio revela que sua teoria tem sido aperfeiçoada por sua própria experiência. Ele, um poço assumido, teve mais relacionamentos com pires, foi abandonado por pratos fundos e ainda não conseguiu explicar porquê. 

Pensando bem, seria de admirar se um poço tivesse todas as respostas, não é mesmo?

 

Antonio Augusto

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Sobre o Autor

Escritor

Antonio Augusto escreve sobre o que vê, sente, entende e aprende.

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