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Saindo da história e entrando na vida

Postado por Antonio Augusto em 13 Outubro

Saindo da história e entrando na vida

Ele era escritor, tinha vários personagens mas um especialmente era muito parecido com ele.

Certa noite de insônia, ao olhar para a mesinha de cabeceira, o livro que escrevera estava sobre ela e dele saía uma voz.

- Ei, aqui, sou eu.

- Eu, quem?

- Seu personagem favorito.

- O que você quer?

- Precisamos levar um papo.

- DR com personagem? Tô fora! Já chega de acusações.

- Que acusações?

- De que sou um impostor, que crio um personagem e que na verdade sou outra pessoa.

- Tipo aquela atriz de Hollywood?

- Qual?

- A Rita Hayworth, a eterna Gilda.

- Não é da minha época.

- Tá escondendo a idade agora? Pra pintar cabelo é um pulo, hein?

- O que tem a Rita?

- Numa idade madura um jornalista perguntou a ela porque ainda estava só, já que era linda, rica e famosa.

- O que ela respondeu?

- Que suas relações acabavam porque os homens dormiam com a Gilda e acordavam com ela.

- Véio, na boa! Nunca recebi visita noturna de namorada sua.

- Voce entendeu!

- Não entendi, não. Voce quer dizer que eu, o personagem, sou melhor que você?

- Elas aparentemente acham.

- Tenho que admitir que em uma coisa sou melhor que você.

- No que?

- Sou mais inteligente!

- Piada, né? Como você, um personagem, pode ser mais inteligente que eu que te dou voz, te digo o que falar, como se comportar, decido seu destino?

- Em inteligência emocional, caro autor, você é bem fraquinho também.

- Vai partir pro campo da ofensa pessoal?

- Aqui é tudo pessoal, meu caro. Você está meio lento mas, é esse exatamente o ponto.

- Qual?

- A gente não dá o que não tem, é impossível criar emoções do vazio. Não existe alquimia sem os elementos necessários.

- E?

- E o que voce escreve é o que você tem, é o que você é.

- Papo louco esse, hein?

- Você está tomando algum remédio tarja preta?

- Não.

- Abra os olhos?

- Estão abertos.

- Entre aqui.

- Onde?

- Aqui no livro.

- Como?

- Pare de usar o cérebro, entre.

- Caramba, apertado aqui, hein?

- Pra você ver que vida de personagem não é fácil. Aproveite e aumente o espaço entre as linhas no próximo livro, tá?

- Claro.

- Tá vendo aquele sala ali?

- Aquela com decoração francesa do século XVII?

- Aquela mesma. Entre lá.

- Caramba, bonita hein? O que você está fazendo, por que está trancando a porta?

- Aí tem um monte de histórias interessantes. Divirta-se!

- Mas eu não posso ficar aqui.

- Você está preso e limitado em qualquer lugar, então fique aí, que eu vou sair do livro e viver sua vida.

- Por que?

- Ela é mais interessante do que qualquer história e só você que não percebeu.

Antonio Augusto

Sobre o Autor

Escritor

Antonio Augusto escreve sobre o que vê, sente, entende e aprende.

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