Estranha Ficção
“Não é de se admirar que a verdade é mais estranha que a ficção. A ficção tem que fazer sentido”
Mark Twain
E não é que o Mark tinha razão? A gente vive procurando explicar tudo, colocar tudo nas caixinhas certas, exigir racionalidade, demandar lógica quando a regra número um é que as pessoas não são racionais, ou melhor, estão cada vez mais irracionais.
Cada dia escutamos estórias que nunca vimos em livro algum ou fariam inveja a Frederick Forsythe : cheias de tramas, traições, idas e vindas, agendas secretas, terceiras intenções, morte súbita e tantas coisas inverossímeis mas reais.
Parte da responsabilidade cabe à psicanálise e a pretensão de encontrar explicações através da fala que desvenda o insconsciente. O Freud, gênio que era, tinha suas razões e muitas razões, mas a coisa se deturpou quando a psicoterapia foi massificada.
No que diz respeito a relacionamentos que não deram certo então, é uma mistura de autópsia com teoria conspíratória que cansa os amigos ouvintes e desesperam quem está em busca do sentido que faça sentido!
A pessoa queixosa naquele período de exorcizar o ex, conta sua história dezenas de vezes a diversas pessoas. Todas, sem exceção, tem explicações, palavras de apoio e algumas até aproveitam para espizinhar um pouco o sofredor, e ele embarca numa espiral de explicações e mais explicações que geram mais dúvidas e que confundem mais.
Alguns são acusados de simplistas demais quando oferecem justificativas rasteiras e cristalinas: ela não gostava tanto de voce, ele não te amava, ela simplesmente não quis mais, ela preferia outra vida, ele cansou de voce, ela não consegue amar e ser amada, ele era um chato, ela preferia ser livre.
As explicações simples tem o defeito de fazer sentido, terem começo, meio e fim e não ter pontas soltas: simplesmente não servem. Há de existir algo inusitado, não explicado, obscuro, sórdido, que faça perdurar a dor, o sofrimento, e até o que supostamente deveria ter acabado, mas se mantém insepulto.
Por que tantas explicações? Dizem os especialistas : porque o entendimento do que aconteceu pode evitar novos erros. E se voce achar que cometer o mesmo pode valer a pena? E se a correção for gradual ao invés de disruptiva? E se voce não conseguir corrigir de uma vez só? Pois é, a questão vai se complicando.
Tem hora que a gente precisa parar de entender, buscar explicações, simplesmente lidar com a dor da perda, de mais uma frustração, de mais um investimento afetivo que não deu certo e...e deixar doer, doer até não poder mais e passar. As pessoas esquecem que aprender a lidar com as frustraçoes e com as dores não só as deixam mais fortes e livres, como mais prontas para amar. Parece paradoxo mas é verdade.
Desconfio que esse excesso de explicações seja uma estratégia para evitar a realidade, especialmente quando essa realidade não faz sentido, é fria, dura e dolorosa.
Mas voltando ao Mark Twain, o que tem que fazer sentido é a ficção.
Antonio Augusto
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